Tese - Beatriz Zachello Nunes

Áreas marinhas protegidas sob ameaça de microplásticos: Uma abordagem multi-escalar

Autor: Beatriz Zachello Nunes (Currículo Lattes)

Resumo

De acordo com a ONU, a tripla crise planetária inclui as mudanças climáticas e a poluição como
principais propulsores da perda contemporânea de biodiversidade. Nessa perspectiva, os aportes de
resíduos sólidos em ambientes naturais, geram impactos sobre diferentes níveis de organização. Entre
os materiais de origem antropogênica, os produzidos a base de polímeros plásticos, desde macro à
microplásticos (MPs), têm sido frequentemente identificados nos ambientes marinhos, representando
uma ameaça significativa à biodiversidade. Em resposta as estas ameaças, a implementação de Áreas
Marinhas Protegidas (AMPs) é parte de uma estratégia global para alcançar objetivos de conservação,
tais como as Metas de Aichi e a Agenda 2030. Contudo, AMPs, especialmente em categorias de
manejo mais restritivas (no-take), permanecem vulneráveis à vários estressores ambientais. Embora
os MPs sejam reconhecidos como contaminantes de preocupação emergente onipresentes, de alta
persistência, e prejudiciais à vida humana e marinha, sua ocorrência, distribuição e impactos foram
escassamente estudos em AMPs. Nesse sentido, o presente estudo avaliou em escalas global e nacional
a contaminação por MPs atingindo AMPs, testando a hipótese de que a contaminação no interior dessas
áreas é similar àquela observada em áreas não protegidas. Enquanto a avaliação global empregou dados
secundários da literatura, avaliando amostras de água sedimento e biota, as abordagens nacionais
foram realizadas usando moluscos bivalves como sentinelas da contaminação por MPs, em AMPs
selecionadas no Brasil e na Austrália. A avaliação global, analisando dados de contaminação em água
do mar, com base em publicações realizadas entre os anos de 2017 e 2020, mostrou que 68 AMPs
apresentaram contaminação por MPs. Similarmente, um total de 186 AMPs tiveram registros de
contaminação com base em estudos que avaliaram a ocorrência de MPs em amostras de sedimento e
biota. Em ambos os casos, as AMPs, pertencentes a diferentes categorias de gestão, mostraram níveis
de contaminação indistintamente distribuídos quando comparados a áreas não protegidas, com
concentrações mais elevadas em áreas de uso múltiplo ou não categorizadas pela IUCN.
Adicionalmente, aproximadamente metade dos registros foram associados aos quartis de alta
concentração. Os estudos de campo empregando sentinelas, em áreas de proteção integral do Brasil e
da Austrália, mostraram níveis de moderados a baixos quando comparados a áreas sem proteção ou de
uso múltiplo. Mais além, os tipos de polímeros encontrados foram consistentes com aquelesreportados
para regiões costeiras e urbanizadas, indicando potenciais fontes múltiplas de contaminação para esta
AMPs. Em ambos os países do Sul global, nenhuma correlação significativa foi encontrada entre as
concentrações de MPs e níveis de urbanização, sugerindo que fatores como fontes locais e condições
hidrodinâmicas podem estar influenciando a contaminação. Tais achados sugerem que as áreas
estudadas oferecem algum nível de proteção contra a contaminação, embora mais esforços de manejo
sejam necessários para atingir níveis de proteção compatíveis com os internacionalmente almejados.
Embora a implementação de AMPs ao redor do mundo possam fornecer algum grau de proteção a
essas áreas, os níveis de contaminação encontrados com base em dados secundários e nas análises in
situ, indicam fontes difusas de contaminação. Assim, monitoramentos de longo prazo devem ser
realizados avaliando simultaneamente o risco ecológico e tendências temporais. Tal abordagem é
essencial, considerando o arcabouço regulatório que potencialmente derivará das decisões tomadas
junto ao tratado global dos plásticos.
Palavras-Chave: microplástico, conservação, poluição, biodiversidade.

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